Ser revisor não é só ver se as vírgulas fazem sentido ou se os «c» foram retirados de modo a que o Novo Acordo seja respeitado, quando o texto é escrito tendo em conta o mesmo. Ser revisor é rever cada palavra, individualmente e no seu conjunto. É pegar nas letras que formam um texto e torná-las bonitas e sonantes. É tudo isto e muito mais.
A arte da revisão implica conhecimento linguístico. Quando percebi a panóplia de pormenores, pormaiores, detalhes, tudo e mais aquele par de botas que teria de saber para conseguir praticar esta arte, pensei em desistir. Achei que nunca seria capaz de encaixar mais informação neste disco rígido já de si tão atulhado. E depois simplificaram a coisa: não, não tens de saber tudo isto de cor. O que tens de saber é ao que estar atenta, desenvolver a sensibilidade, treinar o músculo da revisão, «saber ser humilde e não ter problema de se dizer que é preciso consultar», assim me disseram.
Outra característica relevante é ter conhecimento geral. É verdade que um erro gramatical é grave, chato, apontam o dedo e quiçá até riem. E se for um erro de conteúdo? Tudo se põe em causa. Por esse motivo, é importante dominar-se vários assuntos e, claro, estar atento à narrativa, não vá o Zé Manel, morto morrido e matado no capítulo cinco, estar descansadamente na esplanada, umas páginas à frente, a tomar o belo do cimbalino enquanto pensa «como a vida é boa!» É caso para dizer que é a morte do artista…
Uma das vezes que abri uma caixa de perguntas nas redes sociais, perguntaram-me se o meu trabalho não seria muito solitário. Sim, é. Quando trabalhamos como revisores de forma independente, torna-se um trabalho bastante solitário. Não há aquele colega ali ao lado com quem discutir assuntos ou que simplesmente nos ouça um desabafo da vida em geral. E essa é umas das vantagens de trabalhar numa editora. Muitas vezes pergunto à colega do outro lado da sala se acha que fica melhor A ou B, a que está mais perto responde timidamente que C também não fica mal e daí a cada uma mandar a sua posta é um instante. São conversas interessantes, produtivas e com soluções alternativas.
Por último, no entanto, não menos importante, se estás a ler isto e te estás a preparar para um dia trabalhar nesta área ou ainda é «só» um sonho, aconselho-te a despires o casaco da ilusão. Não quero com isto desanimar, apenas alertar para as dificuldades. Se já tens uma área técnica em que és especializada, pensa que pode ser uma alternativa a trabalhos com uma melhor remuneração, porque a literatura, meus caros, é amor.
Em suma, ser revisor é ser como o outro: inteiro, em que nada em nós exagera ou exclui. É pôr quanto somos no mínimo que revemos.
